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UGT Press 504: Notórios ou notáveis, o novo (novo) governo


17/05/2016

NOTÓRIO E NOTÁVEL: fomos buscar nos dicionários as diferenças entre um e outro termo: notória é pessoa conhecida, pública. A notoriedade pode referir-se à fama, boa ou má. Já notável tem significado mais digno, refere-se a importante, eminente, ilustre ou insigne. Michel Temer apresentou o seu novo ministério e, à primeira vista (ainda é cedo para julgar) tem mais notórios do que notáveis. Evidente que o "acordão" para que ele chegasse à presidência da República passou pelos partidos onde está a nata da política brasileira, na maioria composta por pessoas que agem como sócias do Estado. É uma partilha para se chegar ao poder. Se existirem, os cuidados permanecem restritos à equipe econômica que tem uma tarefa mais do que hercúlea: retomar o crescimento econômico.

 

REFORMAS: provavelmente não haverá reforma política de fundo. Contudo, é preciso votar um pacote mínimo para agradar ao empresariado nacional, afinal é ele quem paga as contas desse sistema político falido. Esse pacote mínimo atingirá em cheio os servidores públicos e os trabalhadores da iniciativa privada. Será mais do que certa a redução do percentual de depósito para o FGTS em dispensa sem justa causa, redução do período de férias, terceirização e flexibilização de pontos importantes da legislação trabalhista e social. Muitos líderes sindicais se postarão ao lado dessas e de outras reformas pontuais do velho arcabouço legal, existente no Brasil há mais de 70 anos. Pelo menos duas centrais sindicais estarão muito próximas de Michel Temer. Contudo, a maioria delas poderá oferecer sérias resistências, não sendo descartada a existência de greves e manifestações.

 

BASE ALIADA: esse conceito estranho, nascido das distorções políticas brasileiras, está naturalmente ressuscitado em todo o seu vigor e, inicialmente, Michel Temer terá à disposição um número de deputados suficientes para fazer o que quiser. O Brasil é diferente de outras democracias, nas quais os nomes dos ministros são escolhidos nos partidos que ganharam as eleições, principalmente no parlamentarismo, cujo partido vencedor fornece o primeiro ministro. Aqui, após as eleições, o presidente forma a sua base de apoio, buscando em meio às negociações os nomes que comporão o governo. Encontra-se aí a raiz dos vícios mais visíveis de nosso sistema político, porque inclui mais do que simples negociações políticas.

 

CENTRÃO: o centro político é um conceito português, criado por Almeida Garret em 1840, com discurso histórico no Parlamento e citado até os dias atuais. No Brasil, Roberto Cardoso Alves (Robertão), deputado atuante, em plena Constituinte (1977) liderou o centrão (coalizão de centro direita), chegando a fazer a releitura da oração de São Francisco de Assis, repetindo a frase "é dando que se recebe". Daquela (governo Sarney) a esta parte, todos os presidentes, para governarem, se valeram dessa maioria espremida entre os lados radicais do espectro político. Turma anódina, mas eficiente em seus objetivos de sobrevivência política e econômica. Nesse sistema espúrio, acrescido do instituto da reeleição, fortaleceu-se a corrupção, hoje uma praga que atinge todos os governos, do menor município à União. Para ganhar credibilidade, o novo governo precisa dar importantes passos na direção de acabar com isso.

 

PORTEIRA FECHADA: o termo origina-se dos tradicionais negócios rurais, onde se compram fazendas, sítios e chácaras de "porteira fechada", quando tudo o que está dentro do imóvel passa a pertencer ao comprador. A expressão foi transladada para a política brasileira e utilizada quando um partido exige ministério, estatal ou autarquia de "porteira fechada", confirmando que ali ele terá total liberdade para nomear, contratar, despedir, enfim, mandar sem restrições. Nem vamos falar das compras e normalmente das polpudas comissões decorrentes delas. Convenhamos, o termo representa o nível a que chegou a política brasileira, sem qualquer respaldo ético ou moral para aqueles que estão nos mais cobiçados cargos da República. Pergunta-se: na nova safra de ministro e partidos de sustentação existem ministérios e estatais que foram entregues de "porteira fechada"? O "acordão" que levou Temer à presidência comportou essas concessões? Tomara que não!

 

FUTURO: sem desatar os nós da economia, certamente, Michel Temer terá dificuldades adicionais. Está visível para a maioria dos analistas que neste e no próximo ano, dificilmente o céu será de brigadeiro. O desemprego é o maior desafio. Ele terá apoio da imprensa e alguns acontecimentos importantes para absorver a atenção popular (Olimpíada e eleições municipais). Contudo, isso é pouco para quem tem biografia indefinida, passando ainda longe da caracterização de estadista e ficando muito próxima da de político, no que é conhecido em terminologia nacional. Tomara que o novo presidente se revele diferente do que a biografia mostrou até hoje e o país possa caminhar bem para o futuro. Se o seu discurso de posse foi um documento aplaudido, seu ministério inclui alguns nomes arrolados em investigações. Ele bem que poderia ter evitado nomeações de gente investigada ou citadas em listas de empreiteiras. Merece, contudo, o benefício da dúvida. 

 

MAIS DO MESMO? embora haja um tênue fio de esperança a nortear a maioria dos brasileiros, a pergunta que não quer calar é: estamos diante de "mais do mesmo"? Amir Khair, perguntou: "Se há pouco a esperar desse quadro político com um Congresso que atua irresponsavelmente na questão fiscal e um Judiciário que quer ampliar os salários já elevados de sua cúpula, o que esperar do que vem emoldurando o debate econômico?" (Estadão, 08-05-16). Enfim, estamos chegando a um novo patamar de relações institucionais e de administração pública? Ou estamos dando continuidade aos vícios eternos da política brasileira? Nossa expectativa, mesmo que a análise possa ser pessimista, é que Michel Temer se revele uma boa surpresa e, imbuído de patriotismo, não nos dê mais do mesmo e inaugure novas práticas na conturbada, difícil e confusa conjuntura nacional.  

 




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