15/03/2022
Deslizamentos deixaram 233 mortos e quatro desaparecidos
Ao completar um mês da tragédia que tirou a vida de 233
pessoas e deixou quatro desaparecidos em Petrópolis, alguns problemas seguem
sem solução. O maior deles é onde acomodar as centenas de pessoas que perderam
suas casas ou tiveram que sair do imóvel, com risco de desabamento, após a
enxurrada que abalou o município na tarde de 15 de fevereiro.
Segundo o último balanço da prefeitura, são 685 pessoas em
abrigos, a maioria em igrejas e escolas. Outras estão provisoriamente em casas
de parentes. A maioria espera a concessão do aluguel social para conseguir novo
lugar para morar, mas o processo está muito lento.
Entre esses casos, está o de Marta dos Santos Ribeiro, que
precisou sair de casa, no Morro da Oficina, e hoje está alojada na casa da
irmã, depois de morar um mês em uma igreja. Ela e o marido Edison Alves da
Silva conversaram com a reportagem no alto do morro, entre os escombros do que
restou das residências, onde tinham ido buscar alguns pertences.
“A gente estava na igreja até quinta-feira passada, só que
tivemos de sair. Nós ainda não achamos casa, mas já fizemos o cadastro. As que
nós encontramos, não aceitam o aluguel social. Já procuramos mais de 20 casas.
O futuro é de muita luta, mas temos fé”, disse ela, que está afastada pela
Previdência, porque se recupera de um câncer.
Outros se deparam com a falta de reconhecimento oficial, por
parte da Defesa Civil do município, de que seus imóveis estão em área de risco,
o que garante o acesso ao aluguel social. É o caso de Camila Lírio, que se
preocupa com seus vizinhos, a maioria moradora ao lado do Morro da Oficina, em
área que também corre risco de futuros desabamentos.
“Estou morando em casa de amigos, mas é provisório. Muita
gente ainda não quer sair, porque alega que não há risco. Isso é mais uma
tragédia anunciada. O que aconteceu do lado de cá pode acontecer do lado de lá.
Tem que oficializar a interdição. Ali tem umas 150 pessoas. Estou correndo
atrás do aluguel social. Para conseguir uma casa, tem que pegar os dados e
levar para a prefeitura, que fará o pagamento na conta do proprietário. Mas
ninguém quer locar, com a incerteza do pagamento”, relatou Camila.
Para o padre José Celestino Coelho, da Paróquia Santo
Antônio, do Alto da Serra, o problema não é simples e demanda maior
planejamento do poder público, para que novas tragédias não aconteçam. Ele viu
tudo bem a sua frente, pois a igreja fica a pouco mais de 100 metros do Morro
da Oficina. E foi para lá que acorreram centenas de pessoas na primeira noite,
em busca de abrigo.
“Aqui chegou a ter 280 pessoas, agora tem 24, que não estão
conseguindo ir para o aluguel social. O ensinamento que ficou é que temos de
ter mais planejamento e fiscalização. Se continuar do jeito que está, é uma
tragédia que vai ficar esquecida e depois virão outras. Infelizmente”, refletiu
o padre.
Desaparecido
Enquanto o problema para uns é buscar nova moradia, o drama
de outros é localizar um parente que continua desaparecido. É o caso de Adauto
Vieira da Silva. Ele tenta, sem sucesso, desde o dia da tragédia, encontrar o
corpo do filho, Lucas Rufino da Silva.
Além dele, Adauto perdeu no deslizamento do Morro da Oficina
a esposa e uma filha, que já foram sepultadas. Porém, o corpo de Lucas, de 21
anos, continua desaparecido. O pai diz que, logo após o temporal, amigos
chegaram a reconhecer, no meio da lama, o que seria o corpo do jovem. Porém,
depois que foi levado para o Instituto Médico Legal, o reconhecimento foi de
outra pessoa, o que causa indignação.
“Eu enterrei a minha esposa e minha filha. E o meu filho? Se
ponham no meu lugar. Tentar tirar o direito de enterrar o meu filho. Ele estava
com 21 anos. Já passou um mês, mas para mim parece que foi ontem. Até quando
vou ter que esperar? Eu só vou ame quietar quando eles solucionarem onde está o
meu filho”, disse ele, próximo ao local onde dois tratores tentavam remover
toneladas de terra, na esperança de localizar o corpo de Lucas.
Comércio
A poucos quilômetros dali o centro de Petrópolis busca
retomar a força de seu comércio, severamente afetado pela inundação. Dezenas de
lojas foram invadidas pela água e lama, ficando semanas fechadas, para limpeza
e reforma das instalações. Na Rua do Imperador, uma das principais da área
central, o que se via na tarde dessa segunda-feira (14) era o oposto dos dias
que se seguiram à tragédia.
Em vez de lojas fechadas, cobertas por grossa camada de
lama, a região voltou a atrair milhares de pessoas. Além dos próprios
moradores, centenas de turistas voltam aos poucos a frequentar o comércio
local, especialmente conhecido pelas confecções de bom preço e qualidade, muito
buscadas por clientes e revendedores.
Um caso que se tornou emblemático foi o da Livraria Nobel,
que perdeu quase 15 mil livros em seu estoque, no subsolo da loja, inundado
pela chuva em questão de minutos, sem dar tempo aos funcionários fazerem nada,
além de salvarem suas próprias vidas.
“Conseguimos reabrir a loja. E para isso tivemos muito
carinho da população. Foi muito rápido. Quando entrou pela porta da frente, o
meu filho já saiu dali com água na cintura. O prejuízo é grande. Não perdemos
só os livros, foram cinco computadores, móveis, divisórias. Agora, quando
começa a chover, fica todo mundo tenso e traumatizado”, contou a proprietária,
Sandra Madeira, que nem por isso pensou em desistir. Afinal, Petrópolis só tem
duas livrarias: a Nobel e a Vozes.
Prefeitura
Procurada para se manifestar sobre os problemas na concessão
dos aluguéis sociais, a prefeitura de Petrópolis respondeu que o último
balanço, de 10 de março, inclui 170 aluguéis sociais. "Importante dizer
que a prefeitura fez todos os esforços para agilizar a concessão de aluguéis
sociais. Um grupo de trabalho, que envolve todas as secretarias, atua na ponta,
auxiliando as famílias na busca por moradia segura. O município também liberou
a exigência do laudo da Defesa Civil pelo período de 60 dias, justamente para
acelerar o processo", escreveu a prefeitura em nota.
Até o momento, foram 1.778 laudos concluídos e 3.012 estão
em andamento. No total, a Defesa Civil tem 5.802 ocorrências registradas.
Fonte: Agência Brasil
Foto: Tomaz Silva/ Agência Brasil
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