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60 obras de Arte e Cultura de Resistência à Ditadura Militar


10/05/2024

A ditadura militar brasileira (1964-1985) dispensou toda sorte de ataques às artes. Sob ordens dos generais-presidentes de plantão, agentes do regime censuraram e proibiram obras, perseguiram e torturaram artistas, destruíram espaços e equipamentos culturais, desmantelaram grupos, coletivos e movimentos artísticos, entre outras atrocidades.


Há também casos – não poucos – de condenações de artistas ao cárcere e ao exílio.


Como todos nós sabemos, o cerco à cultura não impediu a realização de obras de arte audaciosas e memoráveis – muitas das quais confrontavam o próprio regime, de forma aberta ou sutil. Com o projeto Arte e Cultura – 60 Obras de Resistência à Ditadura Militar, o movimento sindical presta uma homenagem a artistas e produções que ajudaram a denunciar e combater o longo ciclo autoritário. Nossa cultura revidou à altura às violações a que foi submetida.


“As várias linguagens estéticas geradas no interior desse campo foram capazes de fundir diferentes horizontes de interpretação e criar narrativas e alegorias destinadas a opinar sobre o Brasil”, resume o relatório final da Comissão Nacional da Verdade.  “A história recente do país atravessa todas essas obras que apresentam, em comum, além de uma singular relação entre arte, política e história, uma inquietude estética e experimental, um impulso criativo e crítico, uma nova visada artística”.


Sob coordenação do Centro de Memória Sindical (CMS) e com apoio das centrais UGT, Força Sindical e CTB, a seleção das 60 obras ficou sob a responsabilidade de seis jornalistas sindicais que também pesquisam a cultura brasileira: André Cintra, Andressa Schpallir, Carolina Maria Ruy, Fábio Ramalho, Susana Buzeli e Val Gomes. Parte da equipe já havia participado do projeto Brasil em 200 Obras (1822-2022) – Bicentenário da Independência.


Agora, nos 60 anos do Golpe de 1964, apresentamos 60 produções nacionais emblemáticas, que nos ajudam a questionar o que foi a mais longa e criminosa ditadura brasileira. Num livro de 1950, William Faulkner escreveu: “O passado nunca está morto. Ele nem mesmo é passado”. Se os fantasmas do regime militar continuam presentes no Brasil, não é o caso de esquecê-los ou ignorá-los – mas, sim, de enfrentá-los e vencê-los. Nesse sentido, as obras de arte podem ser as melhores inspirações.



Confira a lista completa das 60 obras comentadas


1.    1964 – Gritando, Roberto Magalhães – Artes Plásticas


Pintura premonitória do terror que se instalaria no Brasil com o golpe militar.


2.    1964 – Os estatutos do homem, Thiago de Mello – Literatura


Poucos dias após o golpe militar, o amazonense Thiago de Mello lançou de Santiago, no Chile, seu poema premonitório. Os 13 artigos-estrofes – sobre vida, liberdade e esperança – culminam no Artigo Final: “Fica proibido o uso da palavra liberdade, / a qual será suprimida dos dicionários / e do pântano enganoso das bocas. / A partir deste instante / a liberdade será algo vivo e transparente”.


3.    1964 – Não entre à esquerda, Maurício Nogueira Lima – Artes Plásticas


Frases (“Não entre à esquerda”, “Conserve-se à direita” e “Entre pelo cano”) e setas (a da esquerda indica os bairros paulistanos Liberdade, Paraíso e Bela Vista) provocam posicionamento político e reflexão sobre as violações de direitos humanos no País.


4.    1965 – Liberdade, Liberdade, Millôr Fernandes e Flávio Rangel – Teatro


A peça teatral é uma obra clássica da dramaturgia brasileira, que aborda temas como liberdade, opressão, resistência e justiça social, situando-se em um contexto histórico de luta contra a tirania e a opressão. A trama gira em torno da busca pela liberdade individual e coletiva, destacando a importância da resistência e da luta por direitos fundamentais.


5.    1965 – Acender as velas, Zé Ketti – Música


A música denuncia a pobreza e a miséria, as altas taxas de mortalidade e o descaso do poder público com a saúde das crianças pobres dos morros do Rio de Janeiro na década de 60. É considerada uma canção de protesto pela forte crítica social e foi censurada pela ditadura militar.


6.    1966 – Buum!, Marcello Nitsche – Artes Plásticas


Obra pop, de resistência cultural contra o regime militar, se apropria de algo do cotidiano (placa de trânsito) para indicar “conversão à esquerda” e a explosão típica das histórias em quadrinhos, através da onomatopeia Buum!


7.    1966 – Não deixe que prendam Nara Leão, Carlos Drummond de Andrade – Literatura


Poema publicado na imprensa e endereçado ao ditador Castelo Branco. Drummond, um de nossos maiores poetas, sai em defesa de Nara Leão, expoente da Bossa Nova, do Tropicalismo, da MPB e do histórico espetáculo Opinião. Por questionar a falta de liberdade no País, Nara Leão, como tantos outros artistas, também foi ameaçada de prisão pela ditadura.


8.    1966 – O herói, Anna Maria Maiolino (obra refeita em 2000) – Artes Plásticas


A obra, que também antecipava os horrores da ditadura, retrata um militar repleto de medalhas, com cara de caveira, sem vida, sem alma, desumano.


9.    1966 – Torturas e torturados, Márcio Moreira Alves – Literatura


É um livro que aborda um tema extremamente delicado e importante: a questão da tortura em contextos variados. O autor mergulha nas profundezas desse assunto complexo, trazendo à tona relatos e reflexões sobre os impactos físicos, psicológicos e sociais da prática da tortura, tanto para os torturados quanto para os torturadores.


10. 1967 – O Rei da vela, Zé Celso e Teatro Oficina – Teatro


Repleta de referências artísticas, é a primeira montagem da peça de Oswald de Andrade, escrita em 1933 e publicada em 1937. Teatro crítico às relações político-sociais baseadas nos interesses financeiros e na concentração de poder, de resistência e contracultura diante de um sistema de censura, autoritarismo, conservadorismo, individualismo e injustiças.


11. 1967 – Lute, Rubens Gerchman – Artes Plásticas


Com letras gigantescas, a escultura Lute foi exposta no trânsito do Rio de Janeiro para chamar o público para a luta contra a ditadura.


12. 1967 – Terra em transe, Glauber Rocha – Cinema


E um filme icônico, um dos principais representantes do Cinema Novo, que foi lançado em 1967 durante um período da ditadura militar. O filme é conhecido por sua abordagem política e sua crítica social, refletindo o clima de instabilidade e opressão vivido no país na época. A narrativa gira em torno de um intelectual que se vê envolvido em questões políticas e revolucionárias, debatendo temas como poder, corrupção e resistência.


13. 1967 – Navalha na carne, Plínio Marcos – Teatro


Poucos autores foram mais perseguidos pela ditadura do que o “maldito” Plínio Marcos, que teve 18 peças censuradas. Com linguagem crua, suas obras jogam luzes sobre a marginália – o submundo da sociedade. Sua obra-prima, Navalha na Carne, uma das primeiras peças a mostrar abertamente a homossexualidade, foi proibida por 13 anos. Navalha resistiu e tem versões para cinema, ópera e HQs.


14. 1967 – A Opinião pública, Arnaldo Jabor – Cinema


É um filme conhecido por sua abordagem crítica e provocativa em relação à sociedade da época e aos eventos políticos que estavam ocorrendo. Jabor utilizou-se de uma linguagem cinematográfica inovadora para expressar suas ideias e opiniões sobre a realidade brasileira sob o regime autoritário, contribuindo para o debate público e para a resistência cultural da época.


15. 1967 – Ponteio, Edu Lobo, Capinan – Música


A música foi a grande vencedora do 3º Festival de Música Popular Brasileira, em 1967, desbancando “Domingo no Parque”, “Roda Viva” e “Alegria, Alegria”. “Ponteio” traz referências à musicalidade nordestina, grande influência nas obras de Edu Lobo no período. Tendo como personagem um violeiro, a letra de José Carlos Capinan fala da violência da época, faz menção ao desejo de mudança e de novos tempos.


16. 1967 – Roda viva, Chico Buarque de Holanda – Música


Escrita para a peça de teatro de mesmo nome e autor, tornou-se um dos símbolos mais conhecidos da resistência contra a ditadura. A peça chegou a ser alvo do Comando de Caça aos Comunistas em 07/1968 e foi censurada, o que reforçou seu caráter combativo. A música foi apresentada no Terceiro Festival de Música Popular Brasileira, da TV Record, classificando-se em terceiro lugar.


17. 1968 – É proibido proibir, Caetano Veloso – Música


Uma grande provocação musical. Assim foi a apresentação da música, intensamente vaiada no Festival Internacional da Canção, em 68. As roupas extravagantes, a dança erotizada e as guitarras elétricas não foram bem aceitas. “Essa é a juventude que diz que quer tomar o poder? Se forem em política como são em estética, estamos feitos”, afirmou em um manifesto contra a ditadura e contra a juventude “careta”.


18. 1968 – A Prisão, Claudio Tozzi – Artes Plásticas


Com imagem de um policial militar detendo um rapaz, esta obra visava denunciar as arbitrariedades pelas quais o Brasil passava. Chegou a ser confiscada na X Bienal de Arte de São Paulo, de 1969, só reaparecendo dias depois.


19. 1968 – Estudante de medicina em protesto na Cinelândia, Evandro Teixeira – Fotografia


No Rio de Janeiro, em 21/06/1968, o fotógrafo Evandro Teixeira, em uma manifestação contra a ditadura registrou a imagem de um estudante caindo em frente à polícia. Segundo o jornal Folha de São Paulo, Teixeira lembra que: “O rapaz levou uma bordoada tão violenta que se desequilibrou e caiu, batendo a cabeça no meio-fio. Deu um berro horroroso e ficou lá se estrebuchando”. Ele diz acreditar que foi um dos 28 mortos naquele dia.

20. 1968 – Repressão outra vez: eis o saldo, Antonio Manuel – Artes Plásticas

O assassinato do estudante Edson Luís, em 1968, levou à criação de Repressão Outra Vez, com colagens de manchetes e fotos de jornais para mostrar a repressão. “Garoto morto, morreu um estudante”, era a legenda. “Estes trabalhos, que só podiam ser vistos quando o público puxava o tecido negro que os cobria, tinham a intenção de velar e desvelar a violência do período”, afirmou o artista.


21. 1968 – Pra não dizer que não falei das flores, Geraldo Vandré – Música


Popularmente conhecida como “Caminhando”, a música foi censura por incentivar a mobilização política de estudantes, trabalhadores e de toda a população civil. É uma música pacifista que critica o armamento. Entrou para história como hino da resistência não só pela letra, mas pelo tom grave e nostálgico.


22. 1968 – Seja Marginal, Seja Herói, Hélio Oiticica – Artes Plásticas


O poema-bandeira homenageia o bandido Cara de Cavalo, uma das primeiras vítimas da ditadura, em 1964. Acusado de matar um policial, foi jurado de morte e executado com cerca de cem tiros. A obra faz parte do movimento “Marginália” – ou cultura marginal: uma arte experimental e fora dos padrões convencionais – e compôs o cenário de shows de Gilberto Gil, Caetano Veloso e Os Mutantes.


23. 1968 – Papa Highirte, Oduvaldo Vianna Filho (Vianinha) – Teatro


A peça teatral apresenta uma trama envolvente e cheia de reviravoltas, que aborda questões sociais e políticas de forma inteligente e satírica. É uma peça que leva o expectador a questionar as estruturas sociais e os valores da sociedade em que vivemos.


24. 1969 – Bienal do boicote: Boicote internacional contra a X Bienal de São Paulo, (encabeçada pelo crítico de arte) Mário Pedrosa – Performance.


Esse evento marcou um momento significativo na história da arte brasileira, com repercussões tanto no cenário nacional quanto internacional. O boicote trouxe à tona questões importantes relacionadas à liberdade artística, censura e posicionamento político no contexto da época, destacando a resistência cultural, a defesa dos direitos dos artistas e a promoção de um ambiente artístico mais plural e democrático.


25. 1969 – Soy loco por ti, Antonio Manuel – instalação artística


No Salão de Bússola, no Museu de Artes Moderna do Rio de Janeiro, Antonio Manuel expôs três peças “ambientais” com colchões de plástico transparente recheados de mato, incluindo a “cabine” Soy loco por ti com um mapa da América Latina. A decomposição da folhagem durante a exposição gerou uma obra “viva” em referência à situação da América Latina, com o título inspirado em uma canção de Caetano Veloso.


26. 1969 – Sinal fechado, Paulinho da Viola – Música


Vencedora do 5º Festival de MPB da TV Record, quando o Brasil já vivia sob a imposição do AI-5. O texto é um diálogo coloquial entre dois amigos que não se viam há algum tempo, parados no sinal de trânsito de uma cidade grande, externando pressa e seus dramas típicos da vida moderna. Canção gravada posteriormente por outros artistas, entre eles Chico Buarque, no antológico álbum Sinal Fechado.


27. 1969 – O abajur lilás, Plínio Marcos – Teatro


É uma peça teatral em que a história se passa em um bordel e aborda questões sociais e políticas como a opressão das mulheres e a luta por liberdade e dignidade. A trama gira em torno de várias personagens femininas que buscam sobreviver em um ambiente hostil e machista, destacando suas relações interpessoais e conflitos internos. A obra não apenas choca e emociona, mas também levanta questionamentos sobre poder, exploração e resistência, sendo uma peça que continua relevante até os dias atuais.


28. 1969 – Aquele abraço, Gilberto Gil – Música


A canção é uma despedida para o exílio e uma ressignificação das lembranças de Gil sobre o período em que ficou preso. “Aquele abraço” era a forma como os militares o cumprimentavam – de forma sarcástica – na prisão. Era também o bordão do comediante Lilico, que chegou a processá-lo por plágio. Gil embarcou para a Europa uma semana após o show de lançamento da música.


29. 1970 – Trouxas ensanguentadas, Arthur Barrio – Artes Plásticas


Na obra o artista plástico luso-brasileiro lançou 14 trouxas ensanguentadas no córrego Ribeirão Arrudas, no Parque Municipal de Belo Horizonte, intervenção feita para expor o “desovamento” de corpos assassinados pelo “Esquadrão da Morte”. Cada “trouxa” significava um corpo torturado e morto pela ditadura.


30. 1970 – Autorretrato aos 26 anos, Carlos Zilio – Artes Plásticas


A morte, a dor e a falta de liberdade foram temas centrais de inúmeras obras de denúncia e resistência à ditadura. Neste desenho, o artista retrata as suas digitais, o que seriam suas fotos 3×4, com número de fichamento policial, uma cela aberta e o personagem sem camisa, com um coração vermelho no peito.


31. 1971 – Vestido de noiva exposto no desfile protesto político, Zuzu Angel – Moda


O vestido faz parte da coleção-protesto que a estilista Zuzu Angel apresentou na casa do cônsul brasileiro Lauro Soutello Alves, em Nova York, como forma de denunciar a ditadura no Brasil. Um canhão, um militar, um anjo, um sol atrás das grades bordados no vestido, falam da luta de Zuzu para encontrar o corpo do filho Stuart Angel (1946-1971), estudante e ativista morto pela ditadura.


32. 1972 – Graúna, Henfil – Cartum


Com a personagem Graúna, o cartunista Henfil conseguiu usar o humor para criticar a ditadura no auge do regime. É um dos seus personagens mais conhecidos. Junto com seus companheiros Zeferino e Orelana, expressava contrastes e estereótipos de gênero e regionais, em um país que se tornava mais urbano.


33. 1972 – Pesadelo, Maurício Tapajós e Paulo César Pinheiro – Música


Canção imortalizada pelo grupo MPB4. Um verdadeiro hino de resistência e de esperança na liberdade.


34. 1973 – Calabouço, Sérgio Ricardo – Música


A música faz referência à morte do estudante Edson Luís de Lima Souto, assassinado pela polícia durante um protesto no restaurante universitário chamado Calabouço, no Rio de Janeiro, em 28/03/1968. A letra também faz um trocadilho entre Calabouço e Cala a Boca, sendo, desta forma, uma denúncia da censura e da repressão.


35. 1973 – Capa branca do álbum Chico Canta, vários artistas – Artes Gráficas


As capas brancas surgiram nos EUA como crítica à mercantilização cultural. No Brasil, eram forma de protesto e resistência contra a censura. “Chico Canta”, originalmente “Chico Canta Calabar”, trazia uma capa colorida, com o nome “Calabar” pixado em um muro, autoria de Regina Vater. Logo após o lançamento, foi censurado e republicado com alterações em várias músicas e com a nova capa, branca


36. 1973 – Cálice, Chico Buarque e Gilberto Gil – Música


Chico e Gil compuseram a canção metafórica para o Show Phono 73, da Phonogram – cada artista escreveu duas estrofes, em decassílabos. A elas somaram, no refrão, a exortação de Jesus no Monte das Oliveiras antes de ser traído: “Pai, afasta de mim este cálice!”. Ainda que sutis, as denúncias das prisões e torturas à margem da lei levaram a censura a proibir a música, que só foi liberada em 1978.


37. 1973 – Quando secar o rio de minha infância, Frei Tito – Literatura


Poema escrito em Paris, contrapõe as palavras dor, ódio e passado sombrio com as que revelam um lugar e um tempo de amor. Frei Tito Alencar Lima, torturado em 1969, por vários dias, pelo regime militar, morreu em 1974.


38. 1973 – Milagre dos peixes, Milton Nascimento – Música


Após ter letras censuradas pelo regime militar, o que inviabilizou um dueto com o mestre Dorival Caymmi, Milton Nascimento decidiu gravar as músicas em versões instrumentais, potencializando-as com experimentações sonoras, percussivas, vocais e gritos pela liberdade de expressão.


39. 1973 – O Bem-Amado, Dias Gomes – Telenovela


O dramaturgo Dias Gomes conseguiu subverter o status quo ao emplacar em uma grande emissora uma novela que era uma verdadeira sátira do autoritarismo na política brasileira. Odorico Paraguaçu, um demagogo e oportunista caricato, entrou para o imaginário nacional na interpretação de Paulo Gracindo, transmitindo de forma popular e cômica, os interesses por trás da rigidez do regime.


40. 1973 – Que as crianças cantem livre, Taiguara – Música


Taiguara foi um dos artistas mais perseguidos pelo regime militar, com mais de 80 canções vetadas pelos censores, inclusive as de amor. Nesta música, as crianças cantando livres simbolizam a força da resistência e um futuro onde os sonhos e a expressão não são mais cerceados.


41. 1975 – Marca registrada, Letícia Parente – Vídeo-Performance


Na vídeo-performance, a artista costurou a sola do seu próprio pé com a frase “Made in Brazil”, expressão habitualmente encontrada em produtos e brinquedos. Por meio dessa ação simbólica, Letícia abordava a dor de ser brasileira em um período de ditadura, refletindo sobre a submissão do país ao mercado e às influências externas, utilizando a metáfora da costura para simbolizar a ideia de que o Brasil estava sendo marcado e controlado por interesses externos, perdendo sua identidade e autonomia.


42. 1975 – Feliz Ano Novo, Rubem Fonseca – Literatura


O livro de contos que narra a violência de forma bruta e realista foi proibido pela censura um ano após sua publicação. Expõe de forma crua as mazelas sociais e denuncia o contraste entre classes no Brasil durante a ditadura. Sua censura tardia – na terceira edição – causou uma reformulação no Departamento de Polícia Federal, que ganhou mais recursos para o trabalho de repressão.


43. 1975 – A morte no sábado – Homenagem a Vladimir Herzog, Antonio Henrique Amaral – Artes Plásticas


Uma das pinturas feitas pelo artista em homenagem a Vladimir Herzog, jornalista assassinado pela ditadura. O contraste entre o metal de garfos e um amontoado de carne ensanguentada representa alegoricamente a violência militar sobre o corpo dos presos políticos e revela a verdadeira causa da morte de Herzog: a tortura.


44. 1975 – Quem matou Herzog?, Cildo Meireles – Artes Plásticas


A ditadura tentou esconder as circunstâncias da morte do jornalista Vladimir Herzog, assassinado nos porões do DOI-Codi, em São Paulo. O ato ecumênico liderado por D. Paulo Evaristo Arns, Henry Sobel e Jaime Nelson Wright peitou o regime. Parte da série “Inserções”, a obra de Cildo Meireles, “carimbando” a nota de 1 cruzeiro, selou o pacto: a sociedade não se calaria mais.


45. 1978 – Mobilização, Grupo Experimental de Dança – Dança


Dirigido por Lia Robatto, foi criado para a reinauguração do Teatro Castro Alves, em Salvador. Mais de cem artistas ocuparam 31 espaços cênicos espalhados pelo teatro. Pessoas amordaçadas empunhavam cartazes em branco, e a instalação de um ovo preso em uma gaiola representou a censura. O espetáculo integrou dança, teatro, música, artes plásticas, fotografia e cinema.


46. 1979 – O banquete dos mendigos, vários artistas – Música


Álbum com as músicas gravadas no espetáculo de 1973, organizado por Jards Macalé, em comemoração aos 25 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Entre uma música e outra, Ivan Junqueira lia trechos da Declaração, sob aplausos do público que identificava os direitos humanos que a ditadura militar no Brasil não respeitava.


47. 1979 – Cartaz para o fundo de greve dos metalúrgicos do ABC, Elifas Andreato – Artes Gráficas


Cartaz produzido para arrecadar verba para a greve dos metalúrgicos de São Bernardo do Campo em 1979, durante a onda de greves que impulsionou a retomada das ações em massa do movimento sindical.


48. 1979 – O Bêbado e a equilibrista, Aldir Blanc e João Bosco – Música


A abertura “lenta, gradual e segura” da ditadura culminou na Anistia. Partindo da morte de Charles Chaplin, o “bêbado com chapéu coco”, a letra homenageia vítimas da ditadura. O sociólogo Herbert de Sousa, o Betinho, é o “irmão do Henfil”. Os guerrilheiros Carlos Lamarca e Carlos Marighella aparecem pela imagem das viúvas (“Choram Marias e Clarices”). Um clássico!


49. 1981 – Eles não usam black-Tie, Leo Hirszman – Cinema


Baseado na peça homônima, de 1958, de Gianfrancesco Guarnieri, o filme mostra a dificuldade enfrentada por sindicalistas metalúrgicos de São Paulo em realizar uma greve após a campanha salarial de outubro de 1979. Revela os conflitos de posições dentro do próprio movimento sindical e entre os trabalhadores.


50. 1982 – Aqueles dois, de Caio Fernando Abreu – Literatura


Ao lado do cantor e compositor Renato Russo, Caio Fernando Abreu foi uma das últimas grandes perdas no País em decorrência da aids. Os dois, Caio e Renato, usaram licenças da arte para denunciar a opressão e o preconceito. Em Aqueles Dois, a desconfiança – sinédoque da repressão velada da ditadura – se volta contra dois funcionários de uma repartição pública reconhecida como um “deserto de almas”.


51. 1982 – Pra frente, Brasil, Roberto Farias – Cinema


Há filmes que valem menos por suas virtudes artísticas e mais pelas polêmicas que despertam. É o caso do longa de Roberto Farias – o primeiro no País a expor, de modo extremamente realista, a tortura nos porões do regime. E pior: a tortura contra um brasileiro inocente, confundido com um “subversivo”. A liberação do filme custou o cargo de Celso Amorim, então presidente da Embrafilme.


52. 1982 – Feliz ano velho, Marcelo Rubens Paiva – Literatura


Marcelo poderia ter sido um adolescente de classe média como qualquer outro da década de 1970. Mas dois fatos alteram seu destino: o desaparecimento do pai, Rubens Paiva, “sumido” pela ditadura, e a perda dos movimentos do corpo (após um salto inconsequente numa lagoa rasa). Segundo ele, “o futuro é uma quantidade infinita de incertezas”. Feliz Ano Velho foi o livro mais vendido nos anos ‘80.


53. 1983 – Através, Cildo Meireles – Artes Plásticas


Os anos 80 trouxeram a possibilidade de sonhar. Foi um período de transição para um futuro até então incerto. Na instalação de Cildo, estilhaços de vidro cobrem o chão e lembram a tortura. Barreiras de arame farpado e grades remetem à privação de liberdade. As diferentes transparências permitem vislumbrar uma grande massa, sem forma definida, assim como a abertura democrática que estava por vir.


54. 1983 – Anunciação, Alceu Valença – Música


Uma simples canção de amor que no movimento Diretas Já! transformou-se em um hino pelo resgate da democracia, das eleições diretas e da liberdade política no Brasil.