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Sistema capitalista, burnout e a ilusão do tempo livre


23/06/2025

Não é de hoje que estamos vivendo uma crise silenciosa, praticamente invisível.


Ela não está estampada em manchetes de jornais, mas pode ser sentida na exaustão coletiva, nos corpos cansados e nas mentes saturadas.


A promessa de uma vida melhor, mais livre e autônoma, parece cada vez mais inalcançável.


Em pleno século 21, é cada vez mais difícil desconectar, descansar e simplesmente existir no ócio sem culpa. A verdade é que por trás dessa dinâmica está o sistema capitalista, que molda não apenas as relações de produção, mas também nossa própria relação com o tempo.


Vamos entender de onde vem a super produtividade incentivada pelo capitalismo moderno, como identificar burnout e qual é a relação entre tempo e capitalismo.


O que é o capitalismo?

O sistema capitalista é um modelo econômico e social baseado na propriedade privada dos meios de produção, na acumulação de capital e na busca incessante pelo lucro.


Ele se consolidou na transição da Idade Média para a Modernidade, especialmente após a Revolução Industrial, quando o modo de produção capitalista passou a se expandir de forma agressiva.


Ao longo das diferentes fases do capitalismo, esse sistema reestruturou a sociedade, redefinindo valores, relações humanas e nossa maneira de perceber o tempo.


Entre os diversos pensadores que analisam criticamente o capitalismo, Karl Marx diz em sua obra “O Capital” que desvendou as engrenagens desse sistema, mostrando como ele aliena o trabalhador a se render ao tempo sem descanso e transforma todas as dimensões da vida em mercadoria.


A relação do capitalismo, trabalho e tempo

Atualmente, no modo de produção capitalista, o tempo deixa de ser um elemento natural ou subjetivo e passa a ser uma medida rigorosa da produtividade.


É assim que a frase “tempo é dinheiro” nasceu.


Cada minuto conta, e cada segundo improdutivo representa uma perda. Em “O Capital”, Marx mostra como o valor da força de trabalho está atrelado ao tempo de trabalho socialmente necessário para produzi-la.


É aqui que ele determina que o tempo de vida do trabalhador é convertido em mais-valia, ou seja, o valor excedente produzido pelo trabalhador, mas apropriado pelo capitalista.


No capitalismo contemporâneo, marcado por uma nova fase hiperconectada, essa dinâmica se intensificou. As fronteiras entre vida pessoal e trabalho se esvaem. A promessa moderna de liberdade e autonomia parece cada vez mais distante diante da pressão constante por desempenho, das jornadas exaustivas e da dificuldade de desconectar — mesmo fora do expediente.


Com o crescimento do trabalho remoto, especialmente após a pandemia, esse fenômeno se tornou ainda mais evidente. Trabalhar de casa, em teoria, deveria proporcionar mais equilíbrio entre vida pessoal e profissional.


Na prática, muitas vezes isso significa estar permanentemente acessível, responder mensagens fora do horário e ter sua casa transformada em extensão do escritório. A promessa de flexibilidade é, muitas vezes, uma armadilha para uma jornada sem fim.


É nessa jornada exaustiva que o sistema capitalista nos convence de que devemos estar sempre fazendo algo “útil”. E descansar, muitas vezes, não entra nessa equação.


E.P. Thompson e a teoria do tempo medido

O historiador britânico E.P. Thompson, em seu ensaio “Time, Work-Discipline and Industrial Capitalism”, oferece uma contribuição fundamental para entender essa transformação.


Ele mostra em sua pesquisa como, com o avanço do modo de produção capitalista, surge uma nova forma de tempo. A organização tradicional e comunitária do tempo, baseada nos ritmos naturais da vida e nas necessidades sociais, é substituída por uma noção linear, homogênea e controlada.


Mais especificamente, foi a partir das fases do capitalismo industrial que o tempo passou a ser medido, cronometrado e fiscalizado. Foi nesse momento, por volta da Revolução Industrial, que pontualidade, eficiência e produtividade se tornaram virtudes.


Não por acaso, “viver bem” é cada vez mais sinônimo de “produzir mais”. O tempo é mercadoria, e seu valor depende do que se faz com ele. Descansar, contemplar ou simplesmente não fazer nada passa a ser visto como desperdício – de tempo.


Descanso é luxo?

No cerne do sistema capitalista, o tempo não é um direito, é um recurso produtivo. O lazer é monetizado, o descanso é condicionado à produtividade anterior, e o ócio é quase um pecado.


A lógica do desempenho nos acompanha mesmo nos momentos que deveriam ser de pausa. Relaxar agora tem até outro nome. Nos Estados Unidos, um termo famoso para isso é o “Netflix and chill” — que, inclusive, vira uma nova forma de consumo.


Hoje em dia parece que tudo tem um viés e o descanso não pode ser mais protagonismo de ação (ou não ação). A viagem de férias vira conteúdo para as redes sociais. O tempo livre vira tempo para gastar dinheiro, consumir bens e girar a roda do capitalismo.


Mas a questão que fica é: o que o capitalismo fez com o nosso tempo?


Transformou a vida em uma corrida sem fim. A pressão pela produtividade invadiu os espaços mais íntimos. A sensação de culpa ao não fazer nada, de não estar sendo útil, é resultado direto da internalização da lógica capitalista. Mesmo atividades consideradas prazerosas ganham um viés competitivo e enraizado de culpa.


O pensador marxista Mark Fisher, em seu livro “Realismo Capitalista”, fala sobre como o sistema capitalista se tornou tão onipresente que é mais fácil imaginar o fim do mundo do que o fim do capitalismo.


Essa naturalização também afeta nossa percepção do tempo. Não conseguimos mais conceber uma existência fora da pressão por rendimento. E, assim, o descanso se torna, sim, um privilégio.


A necessidade do ócio e saúde mental

Resgatar o ócio como direito e necessidade é um ato de resistência.


O tempo não produtivo é fundamental para a saúde mental e emocional. Em uma sociedade marcada por burnout, ansiedade e depressão, falar sobre descanso é urgente.


Por exemplo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a depressão é a principal causa de incapacidade em todo o mundo, afetando mais de 300 milhões de pessoas. E só no Brasil, dados de 2022 da International Stress Management Association (ISMA-BR) apontam que cerca de 30% dos trabalhadores sofrem de burnout.


O sistema capitalista não prevê pausas e não admite fraquezas.


O ócio criativo, o lazer sem culpa, a desconexão da internet — tudo isso precisa ser reivindicado como parte de uma vida plena. A ideia de que é preciso merecer o descanso é uma armadilha.


A vida não pode ser uma eterna prova de merecimento. Precisamos pensar em alternativas à lógica de desempenho, e isso passa por questionar as próprias bases do modo de produção capitalista.


A alta do burnout

Muito falado, mas pouco explicado, o burnout é um distúrbio psíquico caracterizado por exaustão emocional, sensação de ineficácia e distanciamento do trabalho.


Em 2022, a Organização Mundial da Saúde passou a reconhecê-lo oficialmente como uma síndrome relacionada ao trabalho e incluiu o burnout na CID-11 da OMS. Os sintomas podem incluir cansaço extremo, insônia, dificuldade de concentração, dores no corpo, irritabilidade e sentimentos de desesperança.


Olhando para o Brasil, um levantamento da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT) indica que cerca de 30% das pessoas ocupadas no Brasil sofrem com a síndrome de burnout. Esse número, inclusive, posiciona o país em segundo lugar no ranking mundial de doenças ocupacionais.


Identificar esses sinais precocemente é essencial para evitar agravamentos. E em seguida, buscar apoio profissional é o primeiro passo: psicólogos e psiquiatras podem ajudar com diagnóstico e tratamento.


Além disso, iniciativas de autocuidado como pausas regulares, delimitação de horários e espaços de escuta também são fundamentais. Afinal, hoje em dia a busca por saúde mental também é uma busca por tempo – mesmo que dentro da lógica das atuais fases do capitalismo, seja constantemente negado. É preciso recuperá-lo.


A alta do burnout

Muito falado, mas pouco explicado, o burnout é um distúrbio psíquico caracterizado por exaustão emocional, sensação de ineficácia e distanciamento do trabalho.


Em 2022, a Organização Mundial da Saúde passou a reconhecê-lo oficialmente como uma síndrome relacionada ao trabalho e incluiu o burnout na CID-11 da OMS. Os sintomas podem incluir cansaço extremo, insônia, dificuldade de concentração, dores no corpo, irritabilidade e sentimentos de desesperança.


Olhando para o Brasil, um levantamento da Associação Nacional de Medicina do Trabalho (ANAMT) indica que cerca de 30% das pessoas ocupadas no Brasil sofrem com a síndrome de burnout. Esse número, inclusive, posiciona o país em segundo lugar no ranking mundial de doenças ocupacionais.


Identificar esses sinais precocemente é essencial para evitar agravamentos. E em seguida, buscar apoio profissional é o primeiro passo: psicólogos e psiquiatras podem ajudar com diagnóstico e tratamento.


Além disso, iniciativas de autocuidado como pausas regulares, delimitação de horários e espaços de escuta também são fundamentais. Afinal, hoje em dia a busca por saúde mental também é uma busca por tempo – mesmo que dentro da lógica das atuais fases do capitalismo, seja constantemente negado. É preciso recuperá-lo.


Fonte: Federação dos Trabalhadores da Saúde do Estado de São Paulo




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