07/11/2025
A análise deste contexto, com foco especial nas meninas na área de cuidados, revela uma intersecção crítica com a agenda de mudanças climáticas, tornando o tema incontornável para o debate na COP30, em Belém.
Segundo dados mais recentes do IBGE (PNAD Contínua 2022) e estimativas da OIT e do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI):
O Brasil tem aproximadamente 1,8 milhão de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos em situação de trabalho infantil.
Desse total, cerca de 346 mil têm menos de 14 anos, idade mínima legal para trabalhar como aprendiz — representando 21,6% do total de crianças e adolescentes do país.
O número é maior entre meninos (65%) do que entre meninas, e mais elevado nas áreas rurais e nas regiões Norte e Nordeste.
A maioria atua em atividades informais, sem proteção trabalhista, especialmente na agricultura familiar, comércio ambulante, reciclagem e serviços domésticos.
Embora o país tenha avançado entre 2000 e 2015 — reduzindo o trabalho infantil pela metade — houve reversão dessa tendência a partir de 2016, agravada pela pandemia de COVID-19 e pelo aumento da pobreza.
O trabalho infantil no Brasil é multicausal e está ligado a fatores estruturais:
a) Pobreza e desigualdade social – Famílias sem renda ou em situação de insegurança alimentar acabam recorrendo ao trabalho infantil como forma de sobrevivência.
b) Falta de acesso à educação de qualidade – A evasão escolar, especialmente no ensino fundamental e médio, está diretamente relacionada ao ingresso precoce no trabalho.
c) Cultura e naturalização – Em muitas comunidades, ainda há a ideia de que “trabalhar cedo ensina responsabilidade”, uma visão cultural que ignora os danos físicos e psicológicos.
d) Informalidade e ausência de proteção social – A economia informal e a falta de oportunidades para adultos empurram crianças e adolescentes para o mercado de trabalho.
e) Impactos climáticos e ambientais – Desastres ambientais como secas, enchentes e desmatamento agravam a pobreza rural e urbana, ampliando o risco de exploração infantil.
Este é um ponto novo e crescente no debate atual — o trabalho infantil como consequência da crise climática.
Agricultura e pecuária – cerca de 47% dos casos de trabalho infantil no país.
Comércio e serviços – especialmente vendedores ambulantes e ajudantes em feiras.
Construção civil – adolescentes em tarefas perigosas e informais.
Serviço doméstico – meninas em casas de terceiros, sem vínculo formal.
Reciclagem e lixões – crianças em risco extremo de acidentes e contaminação.
Prejuízos à saúde física e mental, devido a esforços excessivos e exposição a riscos.
Evasão escolar e atraso educacional, comprometendo o futuro profissional.
Ciclo de pobreza intergeracional, pois o trabalho precoce impede o acesso a empregos melhores na vida adulta.
Vulnerabilidade social, incluindo riscos de exploração sexual e violência.
A OIT e o UNICEF alertam que cada ano de trabalho infantil reduz em até 20% a renda futura de uma pessoa.
O Brasil é signatário das principais convenções internacionais:
Convenção nº 138 da OIT – Idade mínima para admissão ao emprego (16 anos; 14 na condição de aprendiz).
Convenção nº 182 da OIT – Proibição das piores formas de trabalho infantil.
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) – Garante o direito à proteção integral.
Constituição Federal (art. 7º, XXXIII) – Proíbe trabalho a menores de 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir dos 14.
O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), criado em 1996, foi um marco importante, mas sofreu redução de orçamento e alcance nos últimos anos.
O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) retomou, a partir de 2023, o fortalecimento da fiscalização trabalhista e a articulação com o Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente.
Retomar e ampliar o PETI e os programas de transferência de renda com foco na infância.
Integrar políticas climáticas e sociais, reconhecendo que desastres ambientais aumentam a vulnerabilidade infantil.
Fortalecer a educação integral e profissionalizante.
Ampliar a fiscalização em setores emergentes da economia verde, evitando que novas cadeias produtivas “sustentáveis” usem mão de obra infantil.
Combater a naturalização cultural do trabalho precoce, com campanhas educativas e diálogo comunitário.
Incluir o tema na agenda da COP30, articulando justiça climática e justiça social.
O perfil do trabalho infantil no Brasil é complexo, mas destaca-se a vulnerabilidade das meninas, especialmente as negras, no chamado trabalho de cuidados e doméstico.
Esse tipo de trabalho é frequentemente invisível, pois ocorre dentro de casas de terceiros ou nos próprios lares, dificultando a fiscalização e o combate.
Trata-se de uma das piores formas de trabalho infantil, segundo a OIT.
A crise climática não é apenas uma questão ambiental; é uma crise de direitos humanos que atua como um multiplicador de ameaças para o trabalho infantil.
Os impactos das mudanças climáticas — como eventos extremos, secas, inundações e tempestades — destroem meios de subsistência, forçando famílias vulneráveis a recorrerem ao trabalho infantil como estratégia de sobrevivência imediata.
A COP30 no Brasil representa uma plataforma crucial para integrar a proteção da infância e o combate ao trabalho infantil na agenda de justiça climática e transição justa.
O debate deve focar em como garantir a resiliência climática de crianças e adolescentes contra a exploração e a violência.
A COP30 oferece uma oportunidade singular para o movimento sindical brasileiro posicionar o trabalho decente e a proteção da infância como elementos centrais da transição para uma economia verde e resiliente.
Mais informações:
Iara Alvarenga Freire – Secretária da Criança e do Adolescente
(41) 99979-6723
UGT - União Geral dos Trabalhadores