20/05/2022
Gritos, humilhação e cobranças pelo cumprimento de metas
levaram a caso de burnout
Um bancário mineiro acaba de receber R$ 1,2 milhão do
Bradesco por ter desenvolvido quadros depressivos graves e burnout decorrentes
da pressão diária pelo cumprimento de metas e resultados.
O valor inclui uma indenização de R$ 50 mil por danos
morais, uma pensão e os salários que ele não recebeu no período em que não foi
autorizado pelo médico da empresa a voltar ao trabalho, mas teve o
auxílio-doença do INSS negado (o chamado limbo previdenciário, quando o
profissional não consegue receber alta do médico da empresa para voltar ao
trabalho e também fica sem o benefício previdenciário).
No processo que apresentou contra o banco na Justiça do
Trabalho, o ex-funcionário contou que era cobrado diariamente em reuniões e
conferências do cumprimento de metas que incluíam a venda de produtos a
clientes.
Com frequência, segundo relatou na ação, essas cobranças
vinham acompanhadas de gritos e tapas na mesa. Certa vez, disse, chegou a ser
chamado de analfabeto por um superior.
Procurado, o Bradesco disse que não vai comentar.
Funcionário do extinto Bamerindus desde os 14 anos, o
bancário tem hoje 50 anos e começou a acumular períodos de afastamento do
trabalho a partir de 2016, sete anos depois da promoção ao cargo de gerente, e
desde 2018 não retoma à função.
Atualmente, ele está aposentado por invalidez pelo INSS
(Instituto Nacional do Seguro Social) –o benefício foi concedido judicialmente
em abril de 2021.
Além dos relatos feitos pelo trabalhador na ação, a Justiça
do Trabalho ouviu outros bancários da mesma agência, que relataram situações
semelhantes, de cobranças diárias, gritos e exposição dos funcionários de
maneira considerada vexatória e humilhante diante de clientes e colegas.
Para a juíza convocada Adriana Goulart de Sena Orsini,
relatora do processo no TRT-3 (Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região), o
conjunto de provas (depoimentos, laudos e relatórios médicos) permite afirmar
que as condições de trabalho agravaram o quadro de saúde do bancário.
"[Ao bancário] era imposto um alto padrão de responsabilidade,
tanto pela função de gerente, quanto pela cobrança excessiva de metas, além de
jornada estendida", escreveu, no relatório, "sendo possível avaliar o
quanto as condições de trabalho possam ter interferido na
saúde mental do reclamante."
No TRT-3, a indenização por dano moral foi aumentada de R$
20 mil, valor definido pela 3ª Vara do Trabalho de Pouso Alegre, para R$ 50
mil.
A advogada Lariane Del Vecchio, do escritório Aith, Badari e
Luchin, que representou o trabalhador, diz que, no processo, foi importante
demonstrar como, até a promoção de cargo, ele não manifestava quaisquer
transtornos e era tido por colegas e subordinados como uma pessoa tranquila e
disposta.
Para a defesa do trabalhador, o banco não só ignorou seu
quadro psiquiátrico, como acabou tendo papel ativo na piora.
Quando estava em seu segundo período de licença médica, o
bancário foi procurado por uma superior. Segundo a advogada, essa chefe pediu
que ele retornasse ao trabalho e prometeu que ele seria transferido de função,
o que nunca aconteceu.
"Hoje ele não consegue passar em frente ao banco. Vive
em constante tratamento. Então é uma situação que afetou sua integridade
física, além da psicológica", afirma.
A pensão pedida pela defesa do trabalhador foi o que
garantiu a ele o pagamento acima de R$ 1 milhão. O banco teve que pagar as
diferenças mensais entre o benefício pago pelo INSS e o valor de seu último
salário, calculados até ele completar 73 anos (a expectativa de vida média,
segundo o IBGE).
"O pensionamento é necessário porque ele teve redução
da sua capacidade de trabalhar. Não vai mais ter horas extras, não vai subir de
cargo ou ter outras chances de promoção."
Para a Justiça do Trabalho, o Bradesco foi omisso ao não
disponibilizar condições adequadas de trabalho ao funcionário.
Em 1º de janeiro deste ano, a síndrome ganhou nova e mais
detalhada descrição na CID-11 (Classificação Internacional de Doenças). De uma
condição de saúde, ela passa a ser descrita como fenômeno ocupacional, no
índice de "problemas associados com estar empregado ou desempregado".
Fonte e Foto: Folha de São Paulo
UGT - União Geral dos Trabalhadores