05/07/2022
Fenômeno aumenta sete pontos porcentuais entre eleições
presidenciais de 2006 e 2018 e passa de 18% para 25%, aponta estudo do
Instituto Votorantim
O desinteresse do brasileiro pelo voto cresce de forma
lenta, gradual e consistente, sobretudo no Sudeste e nas maiores cidades do
País. O fenômeno chamado de alienação eleitoral trata-se da soma das abstenções
passiva – quando o eleitor deixa de comparecer à votação – e ativa – o total de
brancos e nulos. De 2006 a 2018, por exemplo, o índice saltou sete pontos
porcentuais nas eleições presidenciais e passou de 18% para 25%.
Os dados foram coletados pelo Instituto Votorantim em bases
da Justiça Eleitoral e sintetizados no estudo Alienação Eleitoral no Brasil
Democrático, obtido com exclusividade pelo Estadão/Broadcast. No Brasil, o voto
é obrigatório e o comparecimento às urnas – em torno de 75% –, apesar do
aumento da alienação eleitoral, ainda é considerado alto na comparação com
países latino-americanos. No Chile, a taxa foi de 50% em 2018. Costa Rica e
México atingiram 65%.
Chama a atenção, no entanto, o movimento registrado no País
nas duas últimas décadas. De acordo com a pesquisa, de 1998 a 2002, houve forte
processo de queda na alienação, marcado pela implementação das urnas
eletrônicas (com redução de votos brancos e nulos) e pela participação ativa de
eleitores, com queda da abstenção. O voto eletrônico é alvo de críticas do
presidente Jair Bolsonaro (PL).
A partir de 2006, porém, o quadro se reverteu. “A gente
vivenciou nos últimos anos notícias muito críticas sobre políticos, sobre
escândalo de corrupção, por exemplo. A evidência e a propagação de que existem
desvios de função, de finalidade, vão desengajando o eleitor à medida que ele
não percebe um valor no seu voto”, afirmou o gerente-geral do Instituto
Votorantim, Rafael Gioielli.
O Sudeste é a região que teve o maior crescimento da taxa.
Enquanto todas as outras são caracterizadas ou por estabilização da curva de
abstenção passiva (Sul e Centro-Oeste) ou por tendência de queda (Norte e
Nordeste), o Sudeste enfrenta aumento lento, mas consistente. O mesmo vale para
a abstenção ativa, em que votos brancos e nulos estão estáveis em todo o País,
com exceção do Sudeste.
A taxa de eleitores que não foram às urnas na região passou
de 17,2% para 21,6% no período. Os votos brancos e nulos saltaram de 7% para
9,4%. “Em regiões com maior densidade populacional, o contato entre eleitor e
eleito é mais distante, o que tende a gerar menor engajamento eleitoral”,
afirmou Gioielli.
Já na escolha para deputados federais em todo o País, o
crescimento foi de dez pontos, passando de 27%, em 2006, para 37%, em 2018. As
eleições ao Senado são as que apresentam a maior incidência de alienação hoje,
com 26,4%. Em 2006, 32,7% dos aptos a votar deixaram de escolher um senador.
Desencanto
Para a professora de Ciência Política da Universidade
Federal de Pernambuco (UFPE) Nara Pavão, o declínio da participação política é
um fenômeno mundial e atrelado à democracia. “Como a nossa redemocratização foi
recente, as pessoas apostaram muitas fichas na democracia e tinham a
expectativa de que a simples transição resolveria os problemas, quando não foi
isso. A experiência com a democracia gera essa frustração”, disse. O desencanto
é reforçado pela fragmentação política, a existência de partidos fracos e
movimentos da “antipolítica”, segundo ela.
Nas eleições municipais também há uma queda na proporção de
votos brancos e nulos a partir de 1996, em decorrência das urnas eletrônicas. O
mesmo ocorre em relação às taxas de abstenção. De acordo com o levantamento, a
queda na abstenção é de cerca de quatro pontos porcentuais – caiu de 18,3% em
1996 para 14,1% em 2004. Depois, volta a subir.
A variação que mais chama a atenção é a de eleitores que
preferem não comparecer às urnas na data da votação. Esse índice saltou de
14,17% em 2004 para 17,58% em 2016, e atingiu o recorde histórico de 24,47%, em
razão da pandemia da covid-19. Nas cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro, em
2020, a alienação foi superior a 30%.
Fatores
O nível educacional ainda é a variável mais fortemente relacionada
com o comparecimento às urnas, com eleitores com educação superior participando
até três vezes mais de uma eleição do que aqueles com ensino primário. Além
disso, os jovens até 24 anos são os eleitores que acumulam maiores índices de
não comparecimento às urnas. Esse quadro se reduz entre os adultos, de 45 a 59
anos.
Em março deste ano, o total de eleitores entre 16 e 17 anos
chegou ao menor patamar em três décadas. Em resposta, o Tribunal Superior
Eleitoral (TSE), organizações e artistas impulsionaram campanhas para
incentivar o voto jovem. De janeiro a abril, o País ganhou mais de dois milhões
de eleitores nesta faixa etária.
“É preciso um esforço de todos para compreender esse cenário
e revertê-lo, já que, quanto menos engajamento, menor será a representatividade
dos candidatos eleitos em relação à sociedade”, disse a gerente de Gestão de
Programas no Instituto Votorantim, Ana Bonimani.
O estudo apresenta conclusões positivas. Segundo os
pesquisadores, “não há uma crise decorrente do aumento da alienação eleitoral
no País nem existe um processo explosivo sendo produzido no cotidiano das
eleições locais, estaduais e nacionais”. “No que toca ao cenário geral, é
esperado que as próximas eleições tenham uma participação ativa maior,
reduzindo o não comparecimento, ainda mais se a crise sanitária for superada.”
Fonte e Foto: Estadão
UGT - União Geral dos Trabalhadores